Atrofia coriorretiniana pigmentada paravenosa
A Atrofia coriorretiniana pigmentada paravenosa (ACPP) é uma doença rara, de origem desconhecida, caracterizada pela degeneração do epitélio pigmentar, atrofia da coriocapilar e pigmentação que segue o trajeto das veias retinianas.
Na fase inicial da doença, observa-se afinamento das camadas externas da retina e da coroide enquanto o EPR permanece intacto, com a evolução da doença o EPR é afetado, ocorre atrofia da retina que se caracteriza pela perda dos segmentos externos dos fotorreceptores, da camada nuclear interna e da camada nuclear externa. Concomitantemente há o afinamento da camada de células ganglionares e da plexiforme interna.
A causa da atrofia coriorretiniana pigmentada paravenosa é desconhecida. Presume-se que um gatilho inflamatório anteceda as alterações retinianas. Muitos agentes inflamatórios e infecciosos têm sido associados a doença como a sarcoidose, doença de Behçet, sífilis, rubéola e tuberculose e ou herança genética (há descrição na literatura de variantes patogênicas associadas ao RPGR1P1, mutação no CRB1 e no HK1, no entanto são necessários mais estudos).
O quadro é comumente bilateral e simétrico, no entanto há descrição na literatura de casos unilaterais e assimétricos. Comumente os pacientes apresentam-se assintomáticos, sendo muitas das vezes o diagnóstico um achado de exame, e raramente os pacientes queixam-se de leve turvação visual. A exceção ocorre nos pacientes nos quais há o envolvimento macular os quais podem referir importante redução da acuidade visual.
A doença é mais reportada em homens.
Exemplo de retinografia (imagem do fundo de olho) e autofluorescência de um indivíduo com atrofia coriorretiniana pigmentada paravenosa. Fonte: Shen Y, Xu X, Cao H. Pigmented paravenous retinochoroidal atrophy: a case report. BMC Ophthalmol. 2018 Jun 7;18(1):136. doi: 10.1186/s12886-018-0809-z. PMID: 29880028; PMCID: PMC5992745.
Sinais e sintomas
Como dito anteriormente, os indivíduos portadores da atrofia coriorretiniana pigmentada paravenosa são assintomáticos, ou seja, não tem sintomas ou queixas visuais ou em alguns casos, podem apresentar discreto embaçamento visual. Os sintomas aparecem de acordo com o agravamento da atrofia retiniana e com a área de acometimento.
Alguns sintomas relatados são:
- Alterações no campo visual: A doença costuma resultar em uma redução progressiva do campo visual periférico e, em casos avançados, pode afetar também a visão central.
- Visão embaçada: Com o avanço da atrofia, os pacientes podem experimentar uma diminuição progressiva da acuidade visual.
- Fotopsia (percepção de luzes piscando)
- Nictalopia e/ou dificuldade de adaptação ao escuro
- Fotofobia
Diagnóstico
O diagnóstico é realizado pela avaliação do fundo de olho pelo oftalmologista e exames complementares como angiofluoresceinografia, autofluorescência e tomografia de coerência óptica (OCT) Campo Visual (CV) e testes eletrofisiológicos auxiliam na identificação da lesão anatômica e no dimensionamento da disfunção possibilitando assim acompanhar a evolução da doença.
- Fundoscopia: nos casos mais leves, poucas áreas de atrofia coriorretiniana e/ou de pigmentação paravenosa são identificadas. Com a progressão da doença, ocorre o acúmulo de pigmento ao redor das grandes veias estendendo a área atrófica do epitélio pigmentado da retina (EPR), apresentando maiores áreas de lesão acinzentada no fundo de olho. Com a atrofia do EPR, os vasos da coroide são evidenciados.
- Autofluorescência: áreas de hipoautofluorescência devido a perda do EPR podem estar entremeadas por áreas de hiperautofluorescência decorrente do EPR em sofrimento.
- OCT: permite observar o afinamento das camadas internas e externas da retina, a perda dos fotorreceptores e atrofia e desorganização do EPR. Em casos de acometimento macular pode ser observado edema cistoide, membrana epirretiniana e buraco lamelar
- Angiografia Fluorescência (AGF): demonstra hiperfluorescência nas áreas de atrofia coriorretiniana e pode apresentar defeitos em janela devido a degeneração do EPR. Não é observado extravasamento de contraste.
- Indocianina Verde: mostra hiperfluorescência nas áreas atróficas ao longo das que são hiperfluorescentes na AGF, o que indica atrofia de coriocapilar.
- Campo Visual: diminuição de sensibilidade nas áreas do campo visual correspondentes as regiões de atrofia da retina.
- Exames laboratoriais: hemograma, PCR, FAN, RX de tórax, VDRL, FTA-Abs, IGRA ou PPD são indicados para identificação de agente infeccioso/ inflamatório e diagnóstico diferencial das uveítes.
Os principais diagnósticos diferenciais são: retinose pigmentária, retinopatia pigmentária paracentral, degeneração coriorretiniana peripapilar helicoidal, coroidopatia serpiginosa, estrias angióides, atrofia girata, coroideremia, sarcoidose, sífilis, tuberculose, toxoplasmose, distrofia de cones.
Testes eletrofisiológicos na Atrofia coriorretiniana pigmentada paravenosa
O aspecto do fundo de olho e das alterações campimétricas podem ser confundidos com a retinose pigmentária, que é uma doença retiniana mais comum que a ACPP. Leia mais sobre a retinose pigmentária. O diagnóstico diferencial é feito pelo exame de Eletrorretinografia de Campo Total (ERGct) - leia mais sobre o exame - que na ACPP pode ser normal ou com pouca redução funcional e na retinose pigmentária, o acometimento funcional da retina detectado pelo ERGct é muito mais grave, podendo apresentar resposta das células retinianas não detectável em casos mais avançados.
Além da retinose pigmentária, outros diagnósticos diferenciais, que incluem as doenças que causam atrofia coriorretiniana: coroidopatia serpiginosa, estrias angióides, distrofia de cones, atrofia giratta, coroideremia, sífilis, toxoplasmose, entre outros.
O exame de escolha para diagnóstico e acompanhamento é o Eletrorretinograma de campo total (ERGct), no entanto, outras avaliações funcionais com testes eletrofisiológicos podem ser úteis para mapear demais áreas da retina.
Eletro-oculografia: Teste funcional para avaliação do Epitélio Pigmentado da Retina (EPR). Pode apresentar alteração de acordo com a extensão e gravidade da disfunção do EPR.
Eletrorretinografia Multifocal (ERGmf): teste funcional para avaliação da retina central. Em casos de suspeita de alteração na mácula e/ou queixa de perda visual, o ERGmf auxilia na identificação precoce e no mapeamento das alterações maculares.
Tratamento
A evolução da atrofia coriorretiniana pigmentada paravenosa é geralmente estável ou lentamente progressivo. O prognóstico visual é bom principalmente nos pacientes que não apresentam envolvimento macular.
Não há tratamento específico para a doença, o manejo é voltado ao controle dos sintomas e melhor qualidade de vida. As abordagens terapêuticas incluem uso de auxílios ópticos e tecnologias assistivas como lupas e dispositivos de leitura.
Leitura sugerida
Huang HB, Zhang YX. Pigmented paravenous retinochoroidal atrophy (Review). Exp Ther Med. 2014 Jun;7(6):1439-1445. doi: 10.3892/etm.2014.1648. Epub 2014 Mar 28. PMID: 24926324; PMCID: PMC4043609.
Shona OA, Islam F, Robson AG, Webster AR, Moore AT, Michaelides M. PIGMENTED PARAVENOUS CHORIORETINAL ATROPHY: Detailed Clinical Study of a Large Cohort. Retina. 2019 Mar;39(3):514-529. doi: 10.1097/IAE.0000000000001950. PMID: 29300249.
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